domingo, 5 de junho de 2011

TAXA DE SUCESSO

            Gosto bastante de literatura, principalmente de prosa. Uma boa história, temperada com boas figuras de linguagem descrevendo pessoas, lugares ou estados de espírito são para mim a forma mais nobre de usar a Língua. Os poetas dispensam a história e dedicam-se apenas ao sentido figurado, praticam o estilo. Na poesia, a língua é pura imaginação e viaja sem freios. Tem que ser sensível para gostar. Bem sensível.
            Eu não sou muito de poesia. Prefiro quando a figura de linguagem serve a uma boa história. Aliás, adoro. Lendo “A flor da Inglaterra”, de George Orwell, me deparei com uma série de pérolas que me chacoalham por dentro. Um exemplo. O autor descreve o esquisito Sr. Cheeseman como um anão ao contrário, onde as pernas e braços são longos, mas o tronco é curto. Segue dizendo que as nádegas parecem ligadas diretamente às omoplatas, o que lhe dá a aparência de uma “tesoura ambulante”. Outro exemplo da mesma obra. Rosemary caminhando entre as gentes no restaurante lotado é descrita como “um pequeno destróier deslizando por entre cargueiros desgraciosos”. Tudo muito preciso e inusitado. Coisa de gênio.
            Aqui no Brasil foi descoberto um novo uso para esse recurso estilístico. Explico. Aqui a patuléia trabalha de primeiro de janeiro até 30 de abril para depositar seus ganhos no cofrinho do governo. Ele (o governo) é guloso e o pouquinho que sobra para cumprir o Contrato Social com a patuléia é reguladíssimo. Tão regulado que tem que ter muito jeitinho, tem que pedir com carinho para a dona do cofrinho liberar uns trocos. É aí que entram os amigos da dona do cofrinho. Os amigos da dona do cofrinho podem te ensinar a pedir, te ensinar as palavrinhas mágicas a serem colocadas nas propostas de licitações. Se você for muito colaborativo, os amigos da dona do cofrinho podem te incluir no círculo, aí você passa a ser amigo dos amigos da dona do cofrinho, o que torna sua vida muito mais fácil. Só que é feio cobrar por amizades e informações privilegiadas. Aliás, feio não. É ilegal e imoral. Então, não pode simplesmente dizer que se está vendendo favores ou influência. Tem antes que montar uma “consultoria” e dizer que cobra “Taxa de sucesso”. Coisa de gênio.

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